segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Um conto sem título datado de novembro de 2011

- Eu queria muito saber o que passa pela sua cabeça.
- Você sabe, sabe muito bem o que eu penso e sinto.
- Não, não sei. Você usa palavras tão vagas, tudo acaba sempre ficando um... Nada. É, você fala, fala, fala o tempo todo mas não diz nada. Eu não te entendo.
- Ah, não entende? - o sarcasmo saiu amargo de sua boca. Respirou fundo e relaxou os braços que antes, dobrados, apoiavam suas mãos em seu quadril. - Olha, eu não sei nem por onde começar.
- Começa do começo.
- E por onde mais eu o faria? - fria e quente. Azeda, amarga, doce. Impressionante era como ela conseguia ser tudo isso ao mesmo tempo. O sarcasmo fazia parte dela, e ela sabia usá-lo como ninguém. Fosse para o bem ou para o mal, ela nunca perdia a chance de ironizar qualquer coisa. E claro, tinha um ótimo senso de humor. Sarcástico e irônico também. E quando queria implicar, alfinetava o que podia sempre com a dose certa de sarcasmo. Era mestre nisso.
E eu a amava louca e perdidamente. Eu amava todos os lados dela. Eu amava a filha-da-puta que ela era, amava a maturidade daquela menina tão mais nova que eu, amava sua inocência, amava, eu a amava mais do que tudo. Até mesmo porque, na verdade, o tudo era ela mesma. Ela sabia ser, sim, de tudo e mais um pouco. E o que mais me fascinava era como sabia ser uma só, mesmo com tantas personalidades diferentes.
O céu escuro e pouco estrelado fez um barulho que a fez dar um pulo para trás. Ela morria de medo de trovões, raios, tempestade. "O céu tá fazendo barulho, vem me proteger", ela dizia nas noites de tempestade em que me ligava, amedrontada. Mas naquele momento ela não queria, não podia deixar sua moral ser levada pelos barulhos da tempestade que estava por vir. Eu a conhecia bem, e senti uma pitada de orgulho em seu olhar de tenho-de-manter-a-pose. Deu dois passos à frente e disse:
-  Bem, como eu dizia... Olha, eu sou louca por você, é sério. Nada faz sentido se você não tá comigo, e eu juro que faria qualquer coisa pra te ter do meu lado todos os dias da minha vida. - e foi só até aí que escutei, do resto eu só ouvia fragmentos como "eu te amo", "acredito na gente", "dói", "vazio", e essas coisas que sempre me dizia.
Afinal, quem vai querer discutir relação com um par de coxas grossas bem à sua frente? Parecia fazer de propósito. Enquanto falava, apoiou-se na cerquinha branca de madeira da fachada do bar do qual havíamos acabado de sair. Não consegui tirar os olhos de suas pernas um momento sequer. Realmente, aquela movimentação toda tinha que ser proposital. À medida com que ela cruzava e descruzava as pernas, minha vontade de apertar aquelas coxas só aumentava. Dali a pouco não olhava só para as pernas, queria ter seu corpo colado no meu, queria ouvi-la falar do quanto era louca por mim no meu ouvido enquanto eu poderia estar acariciando qualquer parte daquele corpo de menina. Poderia ser a parte interna de uma de suas coxas (sabia melhor do que ninguém o quanto aquilo a deixava maluca), ou talvez os seios por baixo de sua blusa, e nada me impediria de puxar-lhe os cabelos da nuca também... Ela me amava, me queria. Era toda minha, eu sabia que ganhá-la não seria difícil. Chegava a ser ridículo o quão fácil seria, uma vez que qualquer coisinha bonitinha que eu dissesse faria derreter seu pequeno e frágil coração de manteiga. Ela estava na minha mão. Era toda minha.
Não que eu não fosse dela também, é claro. Também a amava demais. Mas acontece que eu me preservava melhor, ainda mais depois de tudo que ela me fizera. Eu estava completamente entregue à ela, até conhecer a babaca que havia dentro daquela não-tão-inocente criança. E agora a situação se invertera. Ela diz que me ama mais do que tudo, que não quer me perder, que tem medo... Tudo o que eu a disse quando a vez de se foder era minha. Hoje, babaca sou eu. Agora sou eu que a faço sofrer, pelo simples fato de querê-la bem.
- Mesmo que você sempre diga que me entende e tudo mais, eu ainda não consegui acreditar nisso. Eu te digo que vai ser difícil agora, que não vai dar pra manter nada saudável no momento e tudo bem, você diz que entende. No outro dia tá chorando, dizendo que não aguenta mais... Você entende mesmo? Porque não parece. Eu só quero o melhor pra gente, e você parece não dar a mínima pra isso! - eu mal pensava no que falar, não planejei, não pensei. Só... falei. Eu pensava no nosso futuro, nos nossos sonhos. Tinha imagens na cabeça, cenas do nosso dia-a-dia morando, vivendo, sonhando, planejando juntas. E foi pensando nisso que disse aquilo tudo.
Ah, ela estava triste. Desabara de vez. Eu podia ver nos olhos dela, conseguia enxergar todo seu sofrimento no mar de lágrimas que se formava naquele olhar angustiado e nervoso.
Enquanto ela abaixava a cabeça devagar, por pouco não entrei em pânico. Detestava vê-la assim. Me senti culpada e obrigada a consolá-la.
- Desculpa! Olha pra mim, linda... Não fica assim, me desculpa.
Ela levantou a cabeça e disse o de sempre:
- Não me pede desculpas, você não fez nada de errado.
Passei as mãos em seu queixo e ajeitei os cabelos que me impediam de ver seu rosto.
- Fiz, sim... Eu não devia ter dito nada, sabia que você ia ficar mal.
- Ora, eu fico mal sem motivos. - ela soluçava ao enxugar as poucas lágrimas que deixara escorrer - Só me machuca o fato de não te ter. Sabe, você é tudo pra mim.
- Mas você me tem! - sabia que não era isso o que ela esperava como resposta.
- Você me entendeu. Eu tô muito cansada. Muito. E minha vontade agora é de desistir! De virar as costas e ir embora, tentar viver sem depender de você desse jeito.
- Se você acha melhor...
- Taí'. Não acho melhor. Se você gosta de mim o tanto que você diz que faz, vai ser pior pra nós duas. Eu prefiro te ter em partes, desse jeito confuso, a não ter nada. Eu preciso de você.
- É, também não acho que vá ser o melhor pra nós se...
- Me deixa falar! - puta da vida. Além de triste e com medo da chuva que chegava, ela agora estava irritada.
Ah, como eu a conhecia bem! Mesmo que seus olhos flamejassem de raiva, logo aquele fogo seria apagado pelas lágrimas que não demorariam a chegar.
- Acontece que eu tô tão cansada, tão triste... Que não penso mais no que é bom ou ruim. Eu tô tão louca pra que isso tudo acabe logo que entro em desespero.
- E o que você quer dizer com isso...? - outro trovão. Ela fez menção de me abraçar, mas seu orgulho a fez recuar. E eu, que tentava me manter fria durante toda a conversa, senti as primeiras gotas de chuva como fogo em meus braços. Como se eu só precisasse de um cenário mais triste pra desabar como ela já tinha feito há tanto tempo.
- Eu... eu desisto.
- Tem certeza?
- Sim, mas você sabe muito bem que vai ser difícil deixar de pensar em você, o que eu sinto não vai mudar, eu sei que não. Não se preocupa, vai ter sempre uma trouxa aqui, te querendo. Só pra você. Sempre.
- Ah, mas...
- Me avisa quando esse teu despertador-da-hora-certa-tocar.
Virou as costas e foi embora. Assim, do mesmo jeito que ela disse que faria.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Tô indo.

Eu vou
E vou andando
Vou correndo
Vou cantando
Vou brincando
Vou sentindo
Vou amando
Vou doendo
Vou sangrando
Vou morrendo
Vou só
Mas vou

Pequenina referência a Oswald de Andrade.

Pensar
Pesar

Um sonho desses, numa noite dessas...

Eu. Você. Pernas, pernas, mãos, braços, corpos suados e um enorme desejo nos unindo.
Esse desejo que, por meses, fora acumulado e reprimido, um desejo proibido, uma paixão impossível e distante. Finalmente teríamos nossa vontade saciada, pelo menos uma vez. Os corações acelerados, as respirações fortes e ofegantes tão perto...
- Vou sentir saudades. - murmurei, ao sentir um aperto no coração que gritava por mais, que queria aproveitar cada pedacinho daquele corpo que nunca mais seria meu. Sabia que o que fazíamos não era certo, mas não havia um vestígio sequer de culpa naquele sofá. Cada toque, cada beijo, cada olhar valia a pena.
- Eu também. Por favor, fica... - você me disse com um olhar doce, com um tom ingênuo mas com a certeza de que era impossível.
- Por hoje eu fico, bonita, por hoje eu fico...
Não quero acordar...